Pare o casamento. O juiz sumiu!
Artigo publicado no jornal Correio do Povo de 24 de março de 1912. A grafia da época foi preservada.
O caso parece, a primeira vista, pura pilheria, mas não o é. Trata-se de uma verdade verdadeira, como diria o mais sério dos homens, mas que, apezar de ser uma legitima e honesta verdade, não deixa de ser, admiravelmente pilherica. Ninguem acreditaria, que um juiz de casamentos abandonaria a cidade num sabbado como o de hontem, dia da semana preferido por quasi todos os noivos para a realisação dos seus mais ardentes sonhos. Pois foi o que aconteceu, hontem, aqui em Porto Alegre. O juiz da vara de casamentos e tambem juiz da comarca, partiu para Gravatahy, afim de installar o jury daquelle termo, justamente na vespera de um dia em que tinha que effectuar 15 casamentos! Imagine-se a somma de contrariedades, aborrecimentos e de prejuizos que a ausencia do juiz de casamentos causou aos 15 casaes que se deviam unir hontem.
Todas as despezas estavam feitas.
Nos armarios, os doces já promptos, brilhavam nas suas cores variadas, e nas cosinhas, mortos em vinha d”alhos, leitões, perus e gallinhas esperavam, pacientemente, pela manhã de hontem para serem levados para os fornos das padarias onde seriam assados e tostados para figurarem nas mesas dos banquetes festivos.
Tudo isso tem de ser renovado. Mais uma vez os gallinheiros serão devastados, os doces, para não azedarem, serão comidos, e outros figurarão nas mesas dos banquetes. Quanta despeza em pura perda e quantos incommodos! Toca a correr para as cocheiras afim de avisar que o casamento ficou adiado por falta de juiz, e toca tambem a prevenir os padrinhos e os convidados para que não se dêem ao trabalho de se vestir de ponto em branco, para acompanhar os noivos na cerimonia nupcial.
E os que tinham de viajar numa linda e doce viagem de nupcias ou porque os seus interesses os chamam para outros logares, como aconteceu ao cavalheiro que, hontem, veiu á redaccção desta folha queixar-se do caso inaudito! Esses então, tiveram de desemmalar as roupas ou de ir, a correr, a bordo do vapor que os devia conduzir para longe, para retirar as malas e as bagagens já embarcadas, no intuito de evitar atropelos de ultima hora.
E foi isso o que succedeu ao citado cavalheiro, que teve que retirar a sua bagagem de bordo, porque só ficara com a roupa para o acto solemne! Ahi tem, os senhores, a serie de prejuizos que a ausencia do juiz de casamentos causou, hontem, áquelles que devia unir pelos laços indissoluveis do matrimonio. Toda essa catastrophe casamenteira, que se teria evitado si o juiz tivesse um substituto legal para casos dessa natureza, ou, ai ao menos, ao em vez de um, houvesse dois juizes de casamento.