A Origem
“Uma cidade só existe, torna-se palpável, adquire densidade humana e espiritual, quando é capaz de resgatar de maneira permanente o seu passado. Sem passado não há história, sem história perde-se a identidade e o futuro.” Sérgio da Costa Franco 1
Nos primeiros anos do século XVIII o Continente de São Pedro (hoje Rio Grande do Sul) ficava numa rota de tropeadas, por onde passavam captores de índios e bandeirantes saídos de antigos afazeres para o novo negócio de correr tropas, campear gado bovino e cavalar e depois comercializá-los “a peso d’ouro”.
Numa dessas levas de tropeadas baldeou-se um tal de Jerônimo, batizado como Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, que em 1732 instalou sua família na região conhecida como “campos de Viamão”, próxima às margens de uma lagoa a qual os índios davam o nome de Guaybe. Naquele tempo ocupar uma gleba, fazer uso dela por mais de cinco anos e prestar-lhe benfeitorias presumia o direito de reclamar sua propriedade. Assim, a 05 de novembro de 1740, a posse dessas terras foi-lhe concedida.
O Boletim Municipal 27/1947, pg. 67, publica: “A Estância de Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos abrangia as terras da vertente ocidental do Morro de Santana, entre o rio Gravataí e o arroio Jacareí, que caracterizamos como sendo o atual arroio Capivara, que corre paralelamente ao rio Gravataí na distância de três léguas (…) em 1740.”2
Quando Jerônimo de Ornelas recebeu a carta de doação ocupava o local com a sua família, parentes e agregados, aproximadamente cem pessoas, no lugar que passou a ser conhecido como Sítio do Dorneles. Assim deu-se o início do povoamento daquela que viria a ser a capital do Rio Grande do Sul: Porto Alegre.
Clovis Silveira de Oliveira em seu livro “Porto Alegre A Cidade e sua Formação”3 relata que os primeiros sesmeiros que chegaram a região, em 1732, Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, Dionisio Rodrigues Mendes e Sebastião Francisco Chaves, não tinham a finalidade de povoar, mas sim de se instalar para a criação de gado. As sedes dessas propriedades não eram adjacentes ao local onde se iniciaria, em 1752, o povoamento das famílias vindas dos Açores.
Dois importantes historiadores tem idéias divergentes sobre a participação de Jerônimo de Ornelas na fundação da cidade. Walter Spalding, em seu livro “A Pequena História de Porto Alegre”4 relata que: “Podemos incluir entre os heróis construtores da sociedade e da história humanas, em condições de igualdade com os maiores, o patriarca Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, o homem de visão que, ocupando com seu pouso e, depois, estância de criar, as terras que constituem, hoje, o município de Porto Alegre, deu início ao povoamento e fundação da mais tarde capital do Rio Grande do Sul.” Por outro lado, Sérgio da Costa Franco no seu Guia Histórico de Porto Alegre5, sobre Jerônimo de Ornelas, pondera que: “Foi um dos primeiros sesmeiros estabelecidos no município de Porto Alegre, sendo que sua fazenda com sede no Morro de Santana, abrangia o núcleo de origem da capital. Sabe-se que desde 1732 se estabeleceu no lugar que ficou conhecido como “Sítio do Dorneles”, e, em 5/11/1740, obteve a concessão da respectiva sesmaria, que tinha como limites o rio Gravataí, o Guaíba, o arroio Dilúvio até o Morro de Santana e uma linha seca deste morro até o Gravataí. (…) Mas não é correto atribuir-lhe a fundação de Porto Alegre, como já aconteceu, pois em nada concorreu para a formação do agrupamento onde nasceria o povoado.”
A ocupação das terras que deram origem a Porto Alegre apresenta um fato curioso. Apesar das evidentes vantagens proporcionadas pelo Guaíba (ligação com uma variedade de redes navegáveis) as sedes das primeiras sesmarias estavam mais próximas de Viamão.
A estância de Jerônimo de Ornelas, chamada de Sítio de Dorneles e, depois, de Porto do Dorneles, abrangia toda a extensão de terras do Morro Santana até a Ponta do Arsenal (Ponta da Cadeia ou Ponta do Gasômetro), cuja importância devia-se ao fato da existência de um porto para o embarque de mercadorias. Que mais tarde recebeu o nome de Porto de Viamão, Porto de São Francisco dos Casais e, por fim, Porto Alegre.
Em 1752 chegam os casais açorianos radicando-se nas proximidades do cais pela facilidade de acesso e ligação a outras vias fluviais.
O Centro de Pesquisa Histórica de Porto Alegre publica em seu site: “O primeiro logradouro construído foi o cemitério, na beira do Guaíba e nas proximidades da Praça da Harmonia que, em seguida, foi transferido para o Morro da Praia, atual Praça Marechal Deodoro ou, como é mais conhecida, Praça da Matriz. Em 1798, foi levantada uma capelinha de barro, coberta por palhas, cujo orago era São Francisco das Chagas, que se localizava na Rua dos Andradas onde funcionou o Cine Guarany (…) A importância estratégica do Guaíba e de sua “esquina” tornaram imprescindível a mudança da administração do continente para Porto Alegre e, assim, em 26 de Março de 1772, foi criada a Freguesia de São Francisco de Porto dos Casais, com jurisdição própria e separada da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Viamão. Isso significava a criação dos primeiros serviços públicos, uma vez que seus habitantes não precisariam deslocar-se até Viamão para realizar os registros de nascimentos, casamentos e óbitos. Eles eram agora porto-alegrenses, nome popular dado ao movimentado porto e a sua gente e onde há vinte anos chegaram os primeiros açorianos vindos de Santa Catarina, atrás de um pedaço de terra que lhes garantissem viver dignamente.”6
Segundo Sérgio da Costa Franco, em seu Guia Histórico de Porto Alegre, a denominação “Porto de Viamão” foi dada a Porto Alegre no início de sua formação em 1752, às margens do Guaíba, com sessenta homens destacados da força de Cristovão Pereira de Abreu. O historiador relata a descrição do Porto de Viamão como “um arraial de casas de palha habitadas de casais da Ilha”.7 O nome de “Porto dos Casais” encontra referências no Livro de Batismos da Freguesia de Viamão, a partir de 1757 8; em 26 de março de1772 foi denominado freguesia de São Francisco do Porto dos Casais 9; em 16 de janeiro de 1773 mudou para Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre (10).
FONTES
1 Franco, Sérgio da Costa, Guia Histórico de Porto Alegre, de, Quarta Edição 2006, contracapa.
2 Caldas, Jacy Tupi, Correntes do Povoamento em Porto Alegre, Boletim Municipal nº 27, 1947, pg. 67.
3 Oliveira, Clovis Silveira, Porto Alegre A Cidade e sua Formação, Ed. Norma, 1985, Pg.3)
4 Spalding, Walter, Pequena História de Porto Alegre, Ed. Sulina, 1967, pg. 21.
5 Franco, Sérgio da Costa, Guia Histórico de Porto Alegre, de, Quarta Edição 2006, pg. 291.
6http://cphpoa.blogspot.com/
7,8,9,10 Franco, Sérgio da Costa, Guia Histórico de Porto Alegre, de, Quarta Edição 2006, pg. 326-328.